quarta-feira, 10 de agosto de 2016

Sobre Deus, e sobre os homens


A honestidade e a compreensão estão em desuso. Somos vistos como um mar de idiotas pelos idiotas que escolhemos para nos governar. Dura realidade, mas é o tipo de coisa que acontece quando nos calamos por muito tempo, deixando que o mal fale enquanto o amor silencia. Infelizmente, não nos faltam exemplos para ilustrar o desamor.
Vimos, esses dias, um espetáculo de horror em nossa câmara: deputados votando em nome de “Deus, da família, e dos bons costumes. ” Me senti, e sinto, envergonhada. Peço perdão a Deus porque, pelo que conheço Dele, pelo infinito amor que eu sei que provém de lá, percebo que nada disso, nenhuma dessas barbaridades são feitas em nome Dele. Nossos deputados, em mais um ato hipócrita, enchem a boca de palavras vazias para enganar um povo que ainda insiste em ter fé. Uma fé que tem sido enganada, distorcida e manipulada. Não se enganem meus amigos, Deus é amor, e amor busca igualdade e honestidade. Esses valores, apesar de estarem presentes nos discursos, se perderam em nossa política, e estão se perdendo também em nossa sociedade.
Eu sinto Deus, ouço muitos discursos a respeito Dele, e analisando os dois lados (o que sinto e o que ouço) não parece tratar-se da mesma pessoa. Confundo-me mas, lá no fundo, sinto que o Deus que eu conheço me quer feliz, me ama, sabe do meu coração e me aceita mesmo falha. Ele entende que eu quero ser boa, e me acolhe. Não olha meus pecados, mas, sim, o amor que eu semeio pelo mundo, e isso basta. O Deus que eu conheço, não me pede provas, me sugere obras.  O Deus sobre o qual ouço falar por aí é legislador, um juiz tirano 24 horas por dia, que não aceita o diferente, e nos fez com a mesma forma para sermos exatamente iguais. É um Deus que se eu erro, me julga e castiga. No seu céu já não me cabe, pois eu peco. Um Deus que só me ama se eu seguir todas as regras. Mas quem criou essas regras?
Quando converso com Deus, vejo que não foi Ele quem criou essas condições para que o amemos, visto que Ele nos ama sem reservas, sem condições. Nos ama apesar de.  Ele não consegue fazer nada que não seja amar. O pedido que me faz é claro: “ame teu próximo como a si mesmo”. Alguém que é capaz de fazer um pedido tão sincero, tão puro, tão despretensioso, não se encontra no meio das cusparadas das regras sobre “santidade” que estamos fartos de ouvir. Estou cansada de discursos vazios e de tantas regras para aceitar os outros: ninguém é perfeito. Quem finge o ser, sem dúvidas, é pior que aquele que é tido como imperfeito, impuro, não santo. Farta de tudo isso, proponho que olhemo-nos, vejamo-nos e amemo-nos. Para que, pelo menos, estejamos no caminho de ser a imagem e semelhança Dele, devemos amar.  Vale a pena repetir:  o Deus que eu conheço é amor, e não sabe fazer outra coisa que não seja amar.
A fé é um sentimento Divino, quando não é cega. É preciso ler, conhecer as instituições que nos regem e desmascarar os lobos que se apresentam em todos os lugares como santos. É necessário pensar por si próprio: chega de absorver as informações prontas que vêm das tv´s, chega de não questionar o porquê das coisas estarem dessa ou daquela forma, chega de votar em qualquer um, chega de achar que a política não tem jeito. É hora de parar de apoiar os extremistas, de endeusar tiranos, de pregar o machismo ou qualquer outra forma de preconceito e desigualdade. Pare de podar quem luta por você, de cortar as asas dos corajosos que querem nos dar vôo. Precisamos entender quem somos e pelo que lutamos sem culpar Deus pela nossa ignorância. E, sobretudo, é hora de parar de praticar o desamor – seja este em nome de Deus, ou em nosso próprio. Somos mais fortes quando juntos. Vamos dar as mãos?
Débora Kelly

sexta-feira, 24 de junho de 2016

O que aprendi com a morte.


Hoje a morte veio me visitar, e ela é a pior visita que pode aparecer na vida, a pior e a mais educadora também. Engraçado que a brevidade dessa caminhada é a única certeza que temos, mas vivemos como se não soubéssemos disso, vivemos achando que seremos eternos, juntamos tesouros mais passageiros que o vento, construímos castelos de areia todos os dias, e constantemente, ao dar atenção às coisas efêmeras esquecemos o que importa de verdade.
Hoje a morte veio me visitar, sentou a mesa comigo, arrancou dos meus braços mais um alguém que eu amo e me ensinou silenciosamente inúmeras coisas sobre o valor e a brevidade da vida. Me tirou o ar e o chão, tirou parte de mim, e abriu feridas de antigas perdas, me fez sentar e abriu meus olhos para a vida que eu deixo escorrer pelos meus dedos todos os dias.
Hoje a morte veio me visitar, e me disse com um olhar que eu não sou imortal, que eu preciso aproveitar meus pais, meu irmão, meus avós, meus tios, primos e amigos, pois eles também não são. Ela me perguntou e me fez lembrar que coisas ficaram daqueles que partiram, que tipo de recordação eu havia guardado deles, e eu não precisei pensar muito para responder que eram os sorrisos, as músicas, os abraços, as conversas que jogamos fora, o exemplo e a força, o amor, que sempre podiam ter acontecido mais vezes, não fosse o desperdício do maior tesouro que temos: o tempo.
Hoje a morte veio me visitar e não disse nada, eu não disse nada, mas tanta coisa se esclareceu, e doeu, e dói, e ainda vai doer pra sempre. Percebi que eu não quero perder tempo, e queria gritar para o mundo, ensinar ao mundo o que aprendi nessas visitas, mas o mundo não tem “tempo a perder” com essas coisas, todos estão apressados demais para parar e conversar uns com os outros, nós infelizmente só escutamos quando a própria morte vem nos ensinar com a dor, com o luto e a ausência. Vejo tanta gente ocupada em semear o ódio, inventar diferenças entre as pessoas, se importar com o pecado do outro, e apontar, segregar, ao invés de dar as mãos e de abraçar. E, nessas horas, a morte ensina o quanto tudo isso é nada.

A morte foi, levou mais uma parte de mim, e eu percebi que crescer é administrar perdas. Ficou a saudade, o vazio que nada preenche, um gosto amargo na boca, mais um dia cinza no calendário, mais uma ferida aberta no coração, e a lição de que não precisamos ter pressa, mas não podemos perder tempo. Amemo-nos, a vida é curta demais e não podemos deixar para aprender sobre o amor, ou sobre a vida com a visita da morte.

Débora Kelly

quinta-feira, 7 de abril de 2016

Gratidão

Estou extasiada, procuro palavras para definir a gratidão e felicidade que sinto, mas não as encontro, elas não são suficientes para expressar a imensidão de sentimentos aqui, mas permaneço tentando.
Esse final de semana foi mágico! Lutar por aquilo que a gente acredita e ver os sonhos tomando forma me trava a garganta, acelera o coração e ilumina meus olhos. Ver o movimento de uma comunidade inteira na direção dos mesmos sonhos que partilhamos, me toma todas as palavras, esgota minhas definições e eu me transformo por inteiro na palavra que mais se aproxima de definir o que sinto: gratidão.
O processo é pesado, a vida é dura, a luta na lida é diária, e a gente se cansa, somos humanos, imperfeitos, frágeis. Quantas e quantas vezes já pensei em desistir? (e quantas vezes ainda pensarei?)... a imperfeição e fragilidade inerentes a minha condição humana não me permitem ser forte sempre, mas a misericórdia do amor é tão grande, que me conhecendo, sabendo minhas fraquezas, diariamente me mostra na poesia da vida inúmeros motivos para que eu continue sonhando, e me ensina que vale a pena sim lutar por esses sonhos.
Eu observei grata cada detalhe preparado, olhei no rosto de cada pessoa que trabalhava conosco e me emocionei durante todo o desenrolar da organização dessa festa que coroa nosso primeiro sonho. Durante o processo, trabalhamos muito, e em meio a sacos de lixo, poeira, limpeza, cuidados com decoração, som, barracas, enfim, toda a correria da preparação do evento, eu refletia sobre a importância de estar no chão antes de subir ao palco, de observar e reconhecer quem fez parte do processo, quem apostou nesse sonho conosco. A importância de abrir o coração e os olhos, ser humilde e cuidadosa ao depositar confiança, ser humilde, trabalhar e confiar na certeza que o melhor virá. Ser humilde!
Se a gente não participa do processo, não limpa o chão antes de subir ao palco, não damos valor a luta e as pessoas de verdade que lutaram também. Não teremos a noção do quanto é difícil realizar sonhos como esse e esqueceremos de onde viemos, quem somos, esqueceremos da importância da humildade.
E, quando observei o trabalho pronto, fechei os olhos e agradeci. A Deus, as pessoas que me enchem de amor e de bons sentimentos, me ajudam a acreditar na humanidade, me ensinam a ser alguém melhor. Agradeci por todo o cuidado que recebo de todos os lados e de todas as formas. Agradeci até pelas coisas que deram ‘errado’ lá atrás, porque só depois daquelas dores eu aprendi a valorizar os sorrisos de hoje. Agradeci e vou continuar agradecendo.
Antes de subir ao palco, passou um filme na minha cabeça. Todos os ensaios, as dores, as coisas que abdiquei para estar ali, a ausência na vida de alguns, as ausências que ainda virão, a solidão que senti e que ainda sentirei, as horas difíceis em que pensei em desistir... mas quando comecei a cantar e olhei pro céu, vi os que me amavam me apoiando ali no céu. E quando olhei para o que me amavam aqui, pude ver e sentir o céu no olhar e no amor que cada um deles emanava para mim.
E tenho duas coisas a dizer: naquele instante tudo vale a pena!

Obrigada!

Débora Kelly

terça-feira, 15 de março de 2016

Veja-se

Eu precisei fugir, e fui... 
Já estou longe de casa a alguns dias, e comecei a perceber algumas coisas essenciais e que ajudam a fazer de mim quem eu sou. 
Vi que certas coisas jamais farão parte das minhas escolhas, e já dá pra perceber que certas estradas jamais me caberão, enquanto eu mesma tento caber dentro de mim... 
Eu tive que fugir, pra entender que a fuga nos mostra onde é o nosso lar, e hoje o meu coração já me chama de volta pra casa. Mas  ainda estou perdida. Por dentro e por fora... Apenas comecei a perceber o que eu não vou ser, e isso já clareia meus passos tão cansados da minha confusão, e me ajuda a caminhar. 
Agora preciso voltar, e depois dessa pausa me olhar no espelho com calma procurando as perguntas que quero me fazer, as que quero fazer ao mundo e também entender as respostas que antecipadamente conquistei antes mesmo de perguntar. 
Preciso me ver de olhos fechados, organizar o que restou da bagunça que sou e reiniciar a caminhada depois do fim que você me obrigou a escrever. 
Preciso limpar as feridas que infeccionaram por falta de ar, deixar meu coração respirar, encarar todas as mulheres que carrego aqui, perceber que sou todas elas, não negar, não mais fugir.
Preciso me ver.
Preciso me olhar sem ter medo de mim. 

Débora Kelly